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Recentemente fui a uma igreja e vi um Pastor que lá pregava, exaltar o povo de Israel e dizer que eles são o legítimo povo de Deus. Este senhor, com mais de três décadas pastoreando, é com certeza um cooperador do Evangelho. Não julgo o seu ministério, apenas discordo de sua frase, que biblicamente está equivocada. Não é só ele que pensa assim. Um dia desses, num fórum sobre o atual conflito israelenses X palestinos, um cristão disse que o bombardeio a Gaza servirá para que todos vejam e glorifiquem o Deus de Abraão.
Este argumento que leva em consideração o Israel-étnico como sendo o povo da aliança que o SENHOR fez com Abraão está em total desacordo com o ensino contido em toda a Escritura. O equívoco do exclusivismo étnico, isto é, do nacionalismo soteriológico é muito comum em diversas igrejas e foi a pedra de tropeço dos judeus que rejeitaram a Cristo, por esperar um Messias político, que iria vencer os dominadores romanos e transformar a sua nação na mais exaltada sobre a face da terra. Por isso, se quisermos ter o reconhecimento de que somos o “povo da Bíblia”, devemos então rechaçar a ideia de que o atual Estado judeu abriga os escolhidos de Yaveh.
O Dispensacionalismo é o grande responsável por tantos equívocos. Esta linha escatológica (parte da Teologia que retrata os últimos acontecimentos) não tem dois séculos de existência, mas foi extremamente difundida entre as Igrejas. Seu ensino impreciso está presente em diversos materiais, incluindo as Bíblias de Estudo, tais como Bíblia Anotada, a Dake, a Scofield, a Plenitude e a Pentecostal. Para apontar todos os erros dispensacionalistas, seria necessário um estudo específico apenas para fazermos tais apontamentos. Por isso, tratarei apenas sobre a questão do exclusivismo étnico.
Antes de me aprofundar, gostaria de dizer que não sou antissemita. E também não estou me vangloriando pela lamentável condição daqueles que são israelenses, mas que estão fora da aliança. Tampouco afirmo que nenhum judeu foi, é e pode ser salvo e herdeiro da Pátria Celestial juntamente com Cristo. O que proponho neste breve texto é esclarecer o que é tão somente um ensinamento bíblico. A salvação nunca foi limitada a uma etnia. Deus chamou para si gente de todos os povos e para comprovar isso será necessário consultar a teologia do Antigo Testamento e também mergulhar nos dois principais autores neotestamentários.
A) A Salvação de Outros Povos no Antigo Testamento
Quando Deus faz a sua aliança com Abraão, a promessa foi que a partir de sua descendência seriam benditas todas as famílias da terra (Gn 12:3). Mesmo fazendo daquele homem uma nação, o SENHOR revela que o seu plano não é de salvar apenas a sua linhagem consanguínea. É tanto que quando Deus ordena a circuncisão como um sinal evidente da aliança, os estrangeiros são incluídos:
Gênesis 17:12 - “O filho de oito dias, pois, será circuncidado, todo o homem nas vossas gerações; o nascido na casa, e o comprado por dinheiro a qualquer estrangeiro, que não for da tua descendência.”
Êxodo 12:48 - “Porém se algum estrangeiro se hospedar contigo e quiser celebrar a páscoa ao Senhor, seja-lhe circuncidado todo o homem, e então chegará a celebrá-la, e será como o natural da terra; mas nenhum incircunciso comerá dela.”
Obviamente, Israel foi uma nação privilegiada, pois dela veio a revelação, e isto inclui a Lei, o culto, a Escritura e o principal: Deus se fez carne e se fez homem-judeu. E foi em solo judaico que o sangue na cruz verteu, para perdoar os pecados de muitos. Vale ressaltar que os primeiros cristãos e líderes da Igreja foram judeus. No entanto, não era o fato de nascer judeu que dava automaticamente ao homem o direito de fazer parte da Congregação dos Santos. Vemos em todo o Antigo Testamento que muitos deles foram infiéis ao concerto e por este motivo, ficaram de fora das promessas. O exemplo mais claro disto está em Números 16, onde relata a morte de cerca de 15 mil pessoas, todos de descendência abraâmica. Morreram no meio do deserto porque foram infiéis. Antes deste episódio, Deus já havia decidido que aquela primeira geração que viveu no Egito não entraria na Terra Prometida, devido a sua incredulidade (Ex 14:23), a exceção foram Josué e Calebe.
Lembremos do livro de Jonas, onde a salvação foi pregada aos ninivitas, um povo gentio e perverso. Lembremos de como Jonas ficou indignado com a salvação de uma nação composta por não-judeus. Ali, o exclusivismo nacionalista dava os seus sinais. Esta concepção era tão forte que mesmo após estarem com Cristo ressurreto, que durante 40 dias lhes falou acerca do Reino de Deus, os discípulos perguntaram se o reino terreno de Israel seria restaurado ainda naquela presente era (At 1:6).
Poderíamos aqui também citar Melquisedeque, que não era judeu e foi chamado sacerdote do Deus altíssimo (Gn 14:18), e por ter abençoado Abraão, demonstra a sua superioridade em relação ao patriarca hebreu. Outros exemplos de gentios que são apresentados como servos do SENHOR são Jó, homem fiel e temente a Deus, de nacionalidade desconhecida. Rute, que era moabita, mas entrou na genealogia messiânica. De igual modo, Raabe, a prostituta de Jericó que se converteu ao Todo-Poderoso e gerou aquele que se casaria com Rute, Boás, bisavô do Rei Davi (Mt 1:5). Se na linhagem do Messias, havia “sangue gentio”, isto revela então que o exclusivismo étnico é um erro crasso na interpretação da História redentora.
B) Paulo Explica Quem São os Filhos de Abraão
Gálatas 3:7 e 29 - “Sabei, pois, que os que são da fé são filhos de Abraão. (...) E, se sois de Cristo, então sois descendência de Abraão, e herdeiros conforme a promessa.”
O verso acima é o mais claro possível. Paulo, hebreu dentre os hebreus (Fl:3-5) é quem evidencia o que já foi dito anteriormente. O povo de Deus é composto por aqueles que possuem a fé na revelação, e Cristo é o ápice da revelação. Podemos ler acerca disto em outra de suas epístolas:
Romanos 4:16 ao 17 - “Portanto, é pela fé, para que seja segundo a graça, a fim de que a promessa seja firme a toda a posteridade, não somente à que é da lei, mas também à que é da fé que teve Abraão, o qual é pai de todos nós, (Como está escrito: Por pai de muitas nações te constituí) perante aquele no qual creu, a saber, Deus, o qual vivifica os mortos, e chama as coisas que não são como se já fossem.”
Abraão é pai dos que creem no que ele creu, sejam estes judeus ou gentios. A nacionalidade não importa (Gl 3:28). Nem a circuncisão - o sinal da aliança veterotestamentária - faz mais sentido. Segundo Paulo, o que importa é ser nova criatura (Gl 6:15). E sabemos que apenas os que estão em Cristo são nascidos de novo e feitos nova criação (2Co 5:20). Se durante a antiga aliança a proporção de gentios incrédulos era tamanha, deixando-os de fora do Israel de Deus, agora pelo sangue de Cristo há uma aproximação e ambos, judeus e gentios, formam um mesmo povo (Ef 2:14).
Mesmo sendo conhecido como apóstolo dos gentios, Paulo frequentava a sinagoga nos locais que chegava e pregava primeiramente para os judeus. Porém a rejeição a Cristo era maior entre os seus patrícios. Agora, na nova aliança, a probabilidade é invertida, e há mais gentios na congregação dos santos do que judeus. Contudo, existe um remanescente fiel entre os israelitas. Deus não os rejeitou por completo. Entre os eleitos pela graça, também encontramos pessoas do Israel-étnico (Rm 11:5). Creio que o atual estado da grande maioria dos israelenses é de cegueira espiritual, pois a Bíblia assim o descreve, porém eu também creio que os israelenses eleitos soberanamente pelo Aba-Pai, continuam sendo adicionados ao Corpo de Cristo, formando o verdadeiro Israel.
C) O Israel de Deus nos Escritos de João
João, o apóstolo amado, foi usado por Deus para escrever 5 livros do Novo Testamento. Em seu Evangelho, narra um episódio tenso entre Jesus e os mestres da Lei. O motivo da tensão, ao ponto de intentarem contra a vida de Cristo foi porque ele negou a filiação abraâmica dos seus ouvintes incrédulos. Além disso, falou que o verdadeiro pai daqueles que eram etnicamente israelitas, todavia, não tinham a fé que teve Abraão, era o Diabo (Jo 8: 39-44). Mais adiante (Jo 10:16) Jesus se apresenta como o bom pastor e fala das ovelhas de outro aprisco que por ele serão apascentadas. Estas ovelhas formam um rebanho e não dois paralelos. A Igreja precisa entender que não existe um tratamento diferenciado por parte do nosso Sumo Pastor. Há um só Israel composto por etnias distintas e todos receberão a mesma parcela do Reino Celestial.
Já em seu livro profético, o Apocalipse, João impelido pelo Senhor dirige-se a igreja de Esmirna e quando trata sobre a tribulação, acusa os que se dizem judeus, mas que não são (Ap 2:9), muito pelo contrário, por perseguirem o verdadeiro rebanho de Cristo, são chamados de “sinagoga de Satanás”. A semelhança com o relato de João 8 é perceptível. Os mesmos judeus recebem o mesmo nome pejorativo no capítulo 3, versículo 9, por fustigarem a igreja da Filadélfia.
Na visão do trono de Deus, em que o livro da vida é apresentado, um cântico celestial é cantando:
Apocalipse 5:9 - “E cantavam um novo cântico, dizendo: Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e povo, e nação.”
Conclusão
O povo adquirido por Deus não tem sangue judaico, apenas. Os que reinarão com Cristo na Jerusalém celestial são de diversas nacionalidades e culturas. O verdadeiro Israel é composto por povos vindos de todo o globo. Não existe um povo que esteja à parte de Jesus, o Salvador que possa reivindicar as promessas que o SENHOR fez ao povo da aliança.
Louvado seja o Cordeiro de Deus, que com sua morte e ressurreição nos comprou para o louvor de sua glória. Aleluia!
Fonte: Bereianos
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