Isvonaldo sou Protestante

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segunda-feira, 10 de junho de 2013

O Choro dos Felizes


Carlos Moreira

“Homem não chora!”. Ouvi isso muitas vezes... Era ainda pequeno, mas estava sendo treinado para ser um “campeão”, para superar a tudo e a todos, ser “forte”, suportar até mesmo a dor. Pura ilusão...

Hoje, homem feito, tenho dificuldades para chorar. Acho que adquiri esse mal com o tempo, impermeabilizando sentimentos, permanecendo firme, retesando a alma para que ela se tornasse imune a qualquer tipo de sensação.

Na “sociedade dos campeões” ninguém deve chorar! Choro é sinônimo de fraqueza, de covardia e pequenez. Para valorizar esta “imperfeição”, todavia, inventaram outros tipos de choro: choro de raiva, choro performático, choro malcriado, choro chantagista. As lágrimas caem, mas são incapazes de produzir qualquer tipo de bem para a alma.

Acredite, chorar produz coisas boas, mas apenas para quem se abre para experimentar os matizes próprios de cada estação da existência. Por isso Jesus afirmou: “Bem aventurados os que choram, pois serão consolados”. Sim, só é pacificado em suas ambigüidades próprias, em suas agonias e contradições àquele que ser rende a enorme fragilidade de ser, pois só é possível refazer o vaso que um dia se quebrou.   

Por isso, só quem se arisca a ser vulnerável é que pode experimentar a grande alegria que há em chorar. Só quem desistir de ser o super-homem conseguirá tirar proveito da dor, da perda, da solidão. Todos os demais estarão lutando contra si mesmos, buscando lubrificar nervos de aço para que a engrenagem psíquica possa suportar a grande “tragédia” de sermos humanos.  

Ah, quão triste é passar pela vida e, aos poucos, quase que imperceptivelmente, perder todas as sensações, ir se desumanizando, tornando-se de lata. Triste é não nos sensibilizarmos mais com a miséria, com a injustiça, com o sofrimento do outro, traços do real que, na tela de nossas vidas, virou apenas drama do imaginário.

Mendigos, velhos, crianças de rua, travestis, drogaditos, para nós são apenas personagens que se exibem no trailer de um filme qualquer, como se jamais pudessem fazer parte da atração principal. Eles estão à margem e lá continuarão. De nós receberão apenas desprezo e, num caso extremo, alguns trocados, quem sabe?  

Digo-te sem medo: é tempo de chorar, de deixar que lágrimas corram pelos nossos olhos de chumbo, encharcados de cinza, fartos de tanto asfalto e concreto. Chore logo, hoje, não deixe para chorar amanhã! Faça como Drummond: “Um dia desses, eu separo um tempinho e ponho em dia todos os choros que não tenho tido tempo de chorar”.

Estou certo que só os felizes é que são capazes de chorar, pois eles entenderam que a vida não é feita só de riso e festa. Diz o salmista “Quem sai andando e chorando enquanto semeia voltará com alegria...”, pois na semeadura da vida, lágrimas são sementes de esperança que regam o chão duro e batido do cotidiano com vistas a produzir paz e bem para o ser.  


Desejo-te, então, um bom choro. 

Carlos Moreira é editor do Genizah e escreve também para A Nova Cristandade.


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