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Por Rev. Augustus Nicodemus Lopes
É
claro que estou brincando – o calvinismo tem muito mais do que cinco ou
seis pontos. Esses que vou citar são alguns dos que creio com respeito à
salvação. E mesmo assim, nem todos os que se consideram calvinistas
concordariam completamente comigo. Meu alvo é tentar esclarecer o que
calvinistas, em geral, acreditam sobre a soberania de Deus e a
responsabilidade humana. Não coloquei textos bíblicos, pois não quero
provar nada – só explicar o que acredito como calvinista.
1 – Creio
que Deus predestinou tudo o que acontece. O Deus que determinou todas
as coisas é um Deus pessoal, inteligente, justo, santo e bom, que traçou
seus planos infalíveis levando em conta a responsabilidade moral de
suas criaturas. Ele não é uma força impessoal, como o destino. Portanto,
as decisões que tomamos não são mera ilusão e nossa sensação de
liberdade ao tomá-las não é uma farsa. Eu acredito que as nossas
decisões e escolhas são bem reais e que fazem a diferença. Elas não são
uma brincadeira de mau gosto da parte de Deus. De uma maneira para mim
misteriosa, porém perfeitamente compatível com um Deus onipotente e
infinito, ele consegue ser soberano sem que a vontade de suas criaturas
seja violentada. Ao mesmo tempo, ao final, sempre prevalecerá aquilo que
Deus já determinou desde a eternidade. Encaro essa relação entre a
soberania de Deus e a responsabilidade humana como sendo parte dos
mistérios acerca do ser Deus, como a doutrina da Trindade e das duas
naturezas de Cristo
2 –
Creio que Deus predestinou desde a eternidade aqueles que irão se
salvar. Esta convicção não me impede de orar pelos descrentes e
evangelizar. Ao contrário, evangelizo com esperança, pois Deus haverá de
salvar pecadores. Creio que Deus já sabe, mas oro assim mesmo. Sei que
ele ouve e responde, e que minhas orações fazem a diferença. Sei também
que, ao final, através de minhas orações, Deus terá realizado toda a sua
vontade. Não sei como ele faz isso. Mas, não me incomoda nem um pouco.
Não creio que minha oração seja um movimento ilusório no tabuleiro da
soberania divina.
3 – Não
creio que Deus predestinou todos para a salvação. Da mesma forma, não
creio que ele foi injusto e nem que ele fez acepção de pessoas para com
aqueles que não foram eleitos. Não creio que Deus tenha predestinado
inocentes ao inferno, pois não há inocentes entre os membros da raça
humana. E nem acredito que ele tenha deixado de conceder sua graça a
quem merecia recebê-la, pois igualmente não há pessoa alguma que mereça
qualquer coisa de Deus, a não ser a justa condenação por seus pecados.
Deus predestinou para a salvação pecadores perdidos, merecedores do
inferno. Ao deixar de predestinar alguns, ele não cometeu injustiça
alguma, no meu entender, pois não tinha qualquer obrigação moral, legal
ou emocional de lhes oferecer qualquer coisa.
4 –
Creio que Deus sabe o futuro, não porque previu o que ia acontecer, mas
porque já determinou tudo que acontecerá. Por isso, entendo que a
presciência de que a Bíblia fala é decorrente da predestinação, e não o
contrário. Negar a predestinação e insistir somente na presciência de
Deus com o alvo de proteger a liberdade do homem levanta outros
problemas. Quem criou o que Deus previu? E, se Deus conhece
antecipadamente a decisão livre que um homem vai tomar no futuro, então
ela não é mais uma decisão livre.
5 – Creio
que apesar de ter decretado tudo que existe desde a eternidade, Deus
acompanha a execução de seus planos dentro do tempo, e se comunica
conosco nessa condição. Quando a Bíblia fala de um jeito que parece que
Deus nem conhece o futuro e que muda de ideia algumas vezes, é Deus
falando como se estivesse dentro do tempo e acompanhando em sequência,
ao nosso lado, os acontecimentos. É a única maneira pela qual ele pode
se fazer compreensível a nós. Quem melhor explica isso é John Frame, no
livro Nenhum Outro Deus, da Editora Cultura Cristã, que recomendo
entusiasticamente.
6 –
Creio que Deus é soberano e bom. A contradição que parece haver entre
um Deus soberano e bom que governa totalmente o universo, por um lado, e
por outro, e a presença do mal nesse universo é apenas aparente e, por
enquanto, sem explicação. Diante da perversidade e dos horrores desse
mundo, alguns dizem que Deus é soberano mas não é bom, pois permite tudo
isto. Outros, que ele é bom mas não é soberano, pois não consegue
impedir tais coisas. Para mim, a Bíblia diz claramente que Deus não
somente é soberano e bom – mas que ele é santo e odeia o mal. Ao mesmo
tempo, a Bíblia reconhece a presença do mal do mundo e a realidade da
dor e do sofrimento que esse mal traz. Ainda assim, não oferece qualquer
explicação sobre como essas duas realidades podem existir ao mesmo
tempo. Simplesmente afirma ambas e pede que vivamos na certeza de que um
dia Deus haverá, mediante Jesus Cristo, de extinguir completamente o
mal e seus efeitos nesse mundo.
Deve
ter ficado claro que um calvinista, para mim, é basicamente um cristão
que aceita o que a Bíblia diz sobre a relação entre Deus e o homem e
reconhece que não tem todas as explicações para as questões levantadas.
Para muitos, esse retrato é de alguém teologicamente fraco e no mínimo
confuso. Mas, na verdade, é o retrato de quem deseja calar onde a Bíblia
se cala.
***
Fonte: Rev. Augustus Nicodemus, via Facebook
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