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Por Luciano Sena
A defesa da fé no arraial Reformado está voltada para duas áreas mais especificas. No debate doutrinário com arminianos; A natureza da eleição, depravação total, etc, faz com que os que defendem o sistema Reformado se envolvam muito nesse debate. Depois, o Reformado discute no campo filosófico, aí voltado mais para o ateísmo, gira em torno se é de fato verdadeira a negação de Deus por parte dos ateus. No mais, especialmente no Brasil – os Reformados não se preocuparam muito com as seitas e falsas religiões no decurso dos anos. Com a raríssima exceção de trabalhar contra as práticas sincretistas do neopentecostalismo, os Reformados no Brasil dependem muito do trabalho de apologistas de outros segmentos evangélicos. Os pentecostais tradicionais produziram farto material a respeito das seitas, e institutos para-eclesiásticos quase que assumiram essa guerra nas últimas décadas.
Apesar de que desde o advento da internet muitos Reformados tenham trabalhado bem com a defesa da fé, vez por outra confrontando os movimentos heréticos tradicionais, ainda notamos que o material é dependente de pesquisas de outros, ou mesmo o conteúdo não reflete tanta pesquisa quando comparado com a defesa dos cinco pontos do calvinismo.
A Teologia Sistemática de Franklin Ferreira e Alan Myatt é uma raridade que deve ser apreciada. Em quase todos os capítulos, os autores (parece que Myatt seja o autor especifico dessas partes) interage o foco doutrinário com o que as seitas e falsas religiões ensinam a respeito. Não é incomum a citação das principais seitas, como Adventismo, Jeovismo, Mormonismo e Espiritismo (e também suas versões afros), receberem atenção específica. Além de religiões animistas, orientais, bem como o Catolicismo e o Islamismo. Fora essa obra erudita, percebemos que o material a respeito de como trabalhar com as seitas, tendo uma perspectiva Reformada, é algo escasso em nosso território nacional.
Qual a diferença?
Visto que os problemas com as seitas são no campo ortodoxo histórico - em contrapartida com todas as denominações cristãs, que diferença há entre ser munido de uma apologética Reformada? Existe uma vantagem significativa, não necessariamente no esquema geral, mas nas bases, os pressupostos, que levam a formar o conteúdo, a sua eficácia e qualidade. Vou citar alguns exemplos para que você entenda o que estou querendo dizer, usando assuntos selecionados.
1º Profetismo/Apostolado/Papismo: O Apologista Reformado leva o “somente a Escritura” até as suas últimas consequências, quer essas sejam latentes ou patentes. Com base na Bíblia (II Tm 3.15-17), sabemos que ‘cessaram aqueles antigos modos de Deus revelar a sua vontade’ (CFW cap. I). Portanto, nosso debate com os Mórmons, Adventistas, Católicos, Tabernáculo da Fé, é na base fundamental da heresia, não em seus efeitos ou evidências. Um apologista pentecostal precisará, evidentemente, sofrer com decepções proféticas dentro de seu movimento, pois existe em ambos os sistemas falsas profecias e acertos. Depois, ele ainda terá que perceber que seus argumentos serão semelhantes a respeito do chamado ‘graus de inspiração’ – que algumas seitas usam também, onde diz que a inspiração atual é menor que a Bíblia! Para o Apologista Reformado, se certa profecia de um líder herético deu certo ou não, não resolverá finalmente a questão, já que para ele, não é isso que está em jogo, mas sim a suficiência da Escritura.
2º Salvação/Méritos/Sacramentos: Nesse caso, o Apologista Reformado está em evidente segurança, pois não há nada, na construção confessional Reformada, que dependa de alguma ação humana para ser salvo – nem mesmo o sim do pecador ou a sua perseverança, que infelizmente, acaba desbocando em alguma impressão de virtude no indivíduo. Nem mesmo o fato de estar em uma Igreja Reformada, determina ao Apologeta Reformado se certo individuo está ou não salvo. O salvo deve estar em Cristo, e o que assegura isso é a eleição, não a decisão humana, méritos, decisões, etc (Rm 11.6). Assim, quando um Mórmon diz para um reformado que ele deve receber o batismo para ser salvo, essa afirmação está inócua e prejudicada, pois a Bíblia ensina outra coisa - anteriormente, no tempo e no espaço quem decidiu a salvação ou não dos que seriam batizados, se eles estão em Cristo é por decisão soberana* (Ef 1.1-11). Isso eleva a questão da Igreja Invisível a um patamar real e verdadeiro. ‘Deus sabe os que lhe pertence’, pois os introduziu em Cristo. Insistir com um Reformado a respeito de uma igreja verdadeira visível, é chover no molhado, visto que o Reformado sabe que a Igreja verdadeira é algo invisível, e está no rol de membros do céu, os tais foram lavados por Cristo de fato e de verdade. O que piora o discurso herético, é que a fé Reformada reconhece que todas as igrejas fieis possuem erros, mas esses erros não podem ser de caráter essencial, pois assim, deixam de ser ‘igrejas verdadeiras’ e passam a ser seitas, sinagogas de Satanás.
[*As seitas são racionalistas, em sua maioria esmagadora. E como tal, não raro, preferem caminhar com o livre-arbítrio como pressuposto. Na verdade, nem todas podem ser classificadas como “arminianas clássicas”, flertam mais com o semi-pelagianismo do que com o arminianismo. E não é incomum rejeitarem a doutrina da imputação da Queda.]
3º Deus/Atributos: O Deus Bíblico é Trino, e ninguém mais que os Reformados preservam a doutrina da Trindade, conforme delineada nos credos históricos, como o Reformado. Outros podem até ser semelhantes, mas melhor compreensão da Trindade não existe:
Pergunta 8: “Há mais de um Deus? Resposta: Há um só Deus, o Deus vivo e verdadeiro (Dt. 6. 4; Jr 10. 10; I Co8. 4).”
Pergunta 9: “Quantas pessoas há na divindade? Resposta: Há três pessoas na divindade: O Pai, o Filho e o Espírito Santo; estas três pessoas são um só Deus verdadeiro e eterno, da mesma substância, iguais em poder e glória, embora distintas pelas suas propriedades pessoais” (Mt 3. 16-17; Mt 28.19; II Co 13. 13; Jo 10. 30).”
(Catecismo Maior de Westminster)
Percebemos que o modelo reformado reflete os Credos Históricos da Trindade.
Com isso, o Apologeta Reformado já sabe que os Mórmons, Testemunhas de Jeová, etc, não falam com o mesmo Deus em mente, causando assim um descompasso total na avaliação de quem É Deus e de tudo que revelou de Si na Escritura. O Reformado sabe que os tais oferecem um falso deus. Além disso, com a perspectiva correta da doutrina da trindade, o Apologeta Reformado vai rapidamente identificar caricaturas, e não uma definição exata.
O Deus Bíblico - da Fé Reformada - também é um ser ilimitado no conhecimento, no domínio, no tempo e no espaço, e mesmo assim a Fé Reformada diz que Deus é “simples” e pessoal. Neste ponto, as seitas deixam de lograr disputa. Um deus que não sabe de tudo, como é dos Testemunhas de Jeová; um deus complexo como o é dos Espíritas; três espíritos corporalmente distintos sendo Deus como ensina o Adventismo; três deuses sendo que dois tendo corpo e um não, como ensinam os Mórmons, não pode ser o Deus da Escritura. A Fé Reformada ensina como diz a Bíblia:
Pergunta 07: “Quem é Deus? Resposta: Deus é Espírito (4.24), em si e por si infinito em seu ser (I Rs 8.27), glória, bem-aventurança e perfeição (Ex 3. 14); todo-suficiente (At 17.24, 25), eterno (Sl 90.2), imutável (Ml 3.6), insondável (Rm 11.33), onipresente (Jr 23.24), onipresente (Ap 4.8), infinito em poder, (Hb 4.13), sabedoria (Rm 16.27), santidade ( Is 6.3), justiça ( Dt 32.4), misericórdia e clemência, longânimo e cheio de bondade e verdade”( Ex. 34.6).”
(Catecismo Maior de Westminster)
4º Vida Cristã: em um quarto campo está o debate a respeito de como a vida cristã é exercida. Mais uma vez o Apologeta Reformado tem uma vantagem. Quando dizemos o lema protestante que “A Bíblia é a nossa única regra de fé e prática”, isso é verdadeiro em nosso caso. A Bíblia inteira, e não o apenas o Novo Testamento! Claro, é o Novo que interpretou e cumpriu o Velho, mas não estamos reféns como estão os dispensacionalistas, que cedem campo considerável para algumas seitas, especialmente os Adventistas, a criticarem virtualmente essa posição. O Novo Testamento usou os Dez Mandamentos, expandindo, melhorando, substituindo, mas nunca rejeitando. O Espírito Santo demonstrou isso quando várias vezes usou o decálogo e/ou o VT, como fonte de instrução para a Igreja na Nova Aliança (Ef 6.1, 2, 3). Com a mesma certeza, para o Apologeta Reformado o Novo Testamento revelou luz maior - notamos que o Senhor Jesus substituiu Moisés e Arão, os apóstolos substituíram os profetas, A Igreja substituiu Israel, o Batismo substituiu a Circuncisão, a Santa Ceia substituiu a Páscoa e o domingo substituiu o sábado, o culto simples substituiu as cerimônias do VT. Nesse sentido, não abandonamos o Velho Testamento, e podemos dizer que a Bíblia é a nossa regra em seus 66 livros, enquanto interpretados pela Nova Aliança.
Conclusão
A melhor apologética contra as heresias é um bom domínio da Dogmática Reformada, isso sem via de dúvidas. Nossos irmãos de outras tradições cristãs, embora tenham feito bom trabalho, ainda sim podem estar labutando em pontos prejudicados por causa de alguns pressupostos. A cadeia de doutrinas defendidas pela fé reformada, como aponta Van Til, serve como um diagnóstico e execução (veja aqui), para identificar uma seita e destruir sofismas, pois nossas armas não são carnais mas poderosas em Deus (II co 10.5).
Sobre o autor: Luciano Sena é evangelista na Igreja Presbiteriana do Brasil, fundador do MCA - Ministério Cristão Apologético, palestrante sobre o tema seitas e heresias e autor do livro A Conspiração Adventista.
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