Isvonaldo sou Protestante

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terça-feira, 25 de dezembro de 2012


Conversei com o Papai Noel sobre o Natal e a Teologia da Prosperidade

Acabei de conversar com o Papai Noel! Acredite. Tentei o contato, inicialmente, por celular, mas o “Bom Velhinho” não o atende de jeito nenhum. Tentei contato por telefone fixo. E nada. Depois de muita insistência, consegui falar com um dos seus duendes assessores e agendei quinze minutos de conversa pelo Messenger. Noel, que ainda está no Polo Norte se preparando para visitar bilhões de residências em todo o mundo, a partir da meia-noite do dia 25 de dezembro, fez declarações surpreendentes, bombásticas, nesta entrevista exclusiva. Acompanhe.

CSZ: Grande Papai Noel, que prazer falar com o senhor! Tudo bem? Em primeiro lugar, como devo chamá-lo?

Papai Noel: 
Ho, ho, ho! Boas festas! Gosto muito dos brasileiros! Eles não são como os alemães, que querem me trocar por São Nicolau... Em Portugal, eu sou o Pai Natal. Nos Estados Unidos, o Santa Claus. Aí no Brasil, a maioria dos meus seguidores me chama de Noel mesmo. Mas também gosto muito de ser chamado de Bom Velhinho.

CSZ: Ah, sim, Bom Velhinho... Noto que o senhor é bem diferente do Aniversariante, o Senhor Jesus, que — inexplicavelmente — é esquecido nesses dias de festas natalinas. Ele, quando veio ao mundo, foi chamado por um rapaz de bom, e disse que bom era Deus, dando toda a glória para o seu Pai...

Papai Noel: 
Em primeiro lugar, para que continuemos a conversar, meu filho, me poupe dessas comparações, pois muitos gostam de me criticar nessa época. Já me falaram até que a pessoa citada — prefiro não mencionar o seu nome — é o verdadeiro Aniversariante e tem o melhor presente, só porque declarou: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida”. Por favor, não me compare com Ele. Eu sou bom porque faço a alegria das crianças, e elas me adoram! E não são apenas elas que me adoram. Aliás, os meus principais adoradores são os adultos!

CSZ: Desculpe-me... Mas, e as crianças miseráveis do continente africano, do Brasil... O que o senhor tem feito por elas?

Papai Noel: Ho, ho, ho! Você acha que eu tenho tempo para os pobres? Não sou como certo Belemita, que viveu numa pobre cidade chamada Nazaré e tinha prazer em ajudar os pobres. Eu até fico penalizado com as crianças pobres, pois elas acreditam mais em mim que as ricas. Mas é a vida, meu filho. Temos de agradar aqueles que podem nos dar alguma coisa em troca.

CSZ: Como assim, Papai Noel? Essa sua mentalidade parece a mesma dos pregadores da Teologia da Prosperidade. O senhor também propaga essa falácia?

Papai Noel: Oh, sim! Ho, ho, ho! Eu sou o próprio deus dessa teologia! E os pregadores dessa teologia são os meus servos...

CSZ: O quê?

Papai Noel: Isso mesmo. As pessoas que seguem à Teologia da Prosperidade me cultuam, mesmo sem ter consciência disso.

CSZ: Sim, eu sei que muitas criancinhas creem que o senhor lhes traz presentes, mas nunca imaginei que se considerasse um deus...

Papai Noel: Ho, ho, ho! Você não conhece nada a meu respeito. As crianças não são as minhas verdadeiras seguidoras. Elas vivem no mundo da fantasia e acreditam ingenuamente em mim. Mas os meus verdadeiros seguidores são pessoas adultas, interesseiras, que vão a templos evangélicos, não para cultuar o Belemita, o Nazareno, do qual elas se dizem discípulas. Elas só querem receber presentes. E, com isso, as minhas igrejas-negócios só crescem!

CSZ: E o senhor dá a essas pessoas o que elas realmente sonham?

Papai Noel: Ora, você acredita em Papai Noel? Ho, ho, ho! Na verdade, elas se iludem, e algumas delas acabam sendo abençoadas pelo Belemita, que se compadece delas. Pena que elas não reconhecem isso. Preferem dizer que as suas vidas mudaram porque foram à igreja tal, participaram da campanha tal, conheceram o apóstolo fulano de tal... Dificilmente glorificam o Homem de Nazaré.

CSZ: Eu não acredito que o senhor está enganando essas pobres pessoas sonhadoras... Quem é o senhor, de fato?

Papai Noel: Como eu já lhe disse, por um lado estou nas fantasias das crianças. Não sou real. Por outro, estou no coração de muitos que se dizem seguidores do Belemita, porém seguem aos ensinos dos meus liderados, que se apresentam com títulos variados: patriarcas, bispos, apóstolos, conferencistas internacionais... É claro que existem os verdadeiros representantes do Homem de Nazaré, os quais se levantam contra a minha obra, mas eles são minoria.

CSZ: Mas, Noel, o senhor está enganado. Nessa época do ano, a maioria dos cristãos se opõe ao senhor e verbera contra coisas pagãs, como árvore de Natal, Papai Noel, etc. Todos nós sabemos que você nada tem que ver com o verdadeiro sentido do Natal.

Papai Noel: Ho, ho, ho! Aí é que você se engana. Alguns pais são tão rigorosos, a ponto de proibirem as pobres criancinhas de tirar fotos com aquele exemplar de Papai Noel no shopping center. Eles tiram delas a alegria de abraçar um velho fofinho, simpático e sorridente. Mas, na verdade, eles — paradoxalmente — me cultuam.

CSZ: O senhor pode explicar melhor como isso ocorre?

Papai Noel: Claro. Eu me aproveito das necessidades das pessoas e do fato de elas serem, por natureza, interesseiras. Por exemplo, é difícil ouvir cristãos dizendo que vão aos cultos para adorar o Nazareno. Antes, afirmam: “Hoje eu vou lá buscar a minha bênção”. E, quando chegam ao templo, os meus liderados tiram proveito disso, massageando os seus egos e lhes dizendo que a vitória financeira e a realização de todos os sonhos estão garantidas, pois o seu deus (no caso, eu), que sonhou todos os sonhos deles, está ali para mudar as suas histórias. Conclusão: todos participam de campanhas para receber prosperidade e a unção financeira dos últimos dias.

CSZ: Quer dizer que o senhor também está por trás dessa polêmica unção financeira?

Papai Noel: Olha, meu filho, se é polêmica, eu não sei. Só sei que o Natal dos meus liderados será gordo! Ho, ho, ho! Alguns têm comprado até jatinhos! Eles estão melhores do que eu, pois ainda estou andando de trenó...

CSZ: (Não acredito que estou lendo isso!) Papai Noel, por favor, uma última pergunta, pois eu sei que o senhor está se preparando para visitar muitas casas à meia-noite do dia 25...

Papai Noel: Sim, é verdade. Mas visitarei também inúmeras igrejas evangélicas para entregar aos meus seguidores várias “caixas de presente”. Antes que você pergunte, essas “caixas” são, na verdade, as palavras de vitória que os meus liderados dizem aos pobres sonhadores, nessa época: “Você nasceu para vencer”, “2013 será o ano da colheita”, “A sua história mudará”, “Ouse sonhar”...

CSZ: Bem, finalizando, muitos estão preocupados em condenar o lado fantasioso e consumista do Natal: árvores, enfeites, fotos com Papai Noel no shopping, ceia de Natal, troca de presentes... E o senhor me mostrou que existe um problema muito maior: um culto tácito, indireto, ao deus Papai Noel. Mas, por que o senhor faz questão de iludir as pessoas?

Papai Noel: Na verdade, meu filho, eu estou a serviço do príncipe deste mundo, também conhecido como o deus deste século, e ele odeia o Belemita. O maior prazer do meu chefe é afastar as pessoas, mesmo as que estão dentro das igrejas, do verdadeiro sentido do Natal.

CSZ: Ah, entendi... Agradeço-lhe, senhor Noel, pela importante e reveladora entrevista que nos concedeu. Deixe uma palavra para os internautas.

Papai Noel: Continuem acreditando em mim! Ho, ho, ho! Mas não digam “Feliz Natal” ou “Merry Christmas”! Não digam nada que faça as pessoas se lembrarem do Menino de Belém. Digam apenas “Boas Festas” ou “Happy Holidays”.

Ciro Sanches Zibordi

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